Tudo pode mudar numa fração de segundo. |
O único compromisso naquela tarde de sábado, depois de encerrar o expediente no escritório, era levar a filha pequena no ensaio da apresentação natalina, em nossa comunidade religiosa, embora uma tarde reparadora de sono estava mais convidativa sob o chuviscar intercalado com os raios de sol.
Pegamos a via expressa em direção à cidade vizinha e logo no começo do trajeto vimos um veículo semidestruído na beira do asfalto. Um poste de eletrificação, tombado, completava o cenário.
- Como alguém consegue bater num poste em linha reta? - Perguntei para minha esposa. Ela respondeu que ainda havia alguém dentro do veículo:
- Deve ter acontecido agora mesmo!
Foi o tempo de frear no acostamento e engatar a marcha ré. Não estacionei muito perto da cena do acidente, para evitar outra batida com algum curioso imprudente - e para que minha filha não visse algo que poderia ser traumático. Completei o retorno caminhando apressadamente, enquanto um vento cortante fazia pingos de chuva explodirem em minha face.
A dianteira do pequeno carro 1.0 parecia uma letra "V". O para-brisa, estilhaçado, havia caído no colo do motorista junto com o requadro de borracha. A caixa de câmbio se encavalou embaixo dos assentos dianteiros. Perca total para um automóvel que, pela aparência de mais de dez anos de uso, provavelmente não tinha seguro, embora isso fosse o de menos.
O homem, balançando a cabeça de um ombro para o outro, tentava se desvencilhar do cinto de segurança que o salvou da morte. Não tive oportunidade de contê-lo. A porta já estava aberta por causa do impacto e ele finalmente se levantou, cambaleante.
- Você está bem? - Foi o que consegui dizer instintivamente.
Não compreendi sua resposta, pois estava soluçando. Sua aparência de meia idade não condizia com seu estado emocional, que mais lembrava o de um garoto órfão resmungando.
- Me machuquei e ninguém parou para me ajudar...
De fato, enquanto estive com ele, carros passavam sem parar naquela avenida que mais parecia uma estrada. Antigamente alguns veículos reduziriam a velocidade e as pessoas olhariam para o lado, mas nem isso consegui vislumbrar.
- Você não está mais sozinho. Vai dar tudo certo - Foi o que me veio em mente para tentar acalmá-lo, enquanto procurava o telefone celular no bolso da calça.
- Vou chamar o resgate.
- Ligue antes para minha esposa, ela pensa que estou numa festa.
- Certo. Me fale o número.
Ele entregou os três primeiros algarismos, mas não se recordou do resto. Sua testa tinha um corte profundo por onde o sangue escorria num vermelho reluzente, fazendo contraste com sua tez negra. Em cada vinco de expressão o sangue se espalhava para as laterais, de modo a parecer, ironicamente, a silhueta de um pinheiro natalino.
Ao longe vejo um camburão da Guarda Municipal se aproximando. Uma policial o reprendeu por estar de pé, correndo o risco de agravar alguma lesão interna. Preferi convidá-lo a se sentar na viatura, pois a chuva estava apertando. Por sorte, uma ambulância chegou na sequência. Certamente alguém já tinha visto o acidente e acionou o socorro por telefone, sem aguardar que este viesse.
- Agora que chegou a ajuda profissional creio que posso ir. Se cuide, meu amigo!
O chamei de amigo sem ao menos saber seu nome. Ele se virou para mim e estendeu sua mão, igualmente ensanguentada. Tive receio de apertá-la, porém, tal pensamento ocorreu de forma tão rápida que ele não percebeu meu vacilo. Apertei sua mão fortemente até ouvir:
- Obrigado!
Havia cumplicidade naquele gesto. Ele sabia que eu me sentia impotente naquela situação. No entanto, ter feito companhia para ele num momento tão difícil lhe trouxe algum consolo. Ao menos pensar nisso também me consola um pouco. Nada suficiente para nos fazer esquecer que somos frágeis demais diante das adversidades que colhem as pessoas aleatoriamente.
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ResponderExcluirO Homem das sangrentas batalhas desde tempos imemoriais, continua em batalhas sangrentas e com uma diferença: evoluiu e já tem medo do sangue alheio. Que o Salvador neste e em todos Natais ilumine o Homem a aprender e efetivamente amar o próximo.
ResponderExcluirAcróstico: O NATAL DOS PRESOS DA LAVA JATO
ResponderExcluirAutor: AHT – Anibal Hercules Tosetto
Ontem, poderosos e riam dos Honestos.
No entanto, nada neste mundo é imutável
A não ser a vontade de Deus.
Tudo flui, se concretiza e se esfarela.
A vida nasce, finda e renasce sob a
Luz Divina.
Dos Homens de Boa Vontade,
Orações por Paz na Terra.
Salvador, que é o Cristo Senhor, nasceu.
Prisão, penitenciária – é pela Justiça dos Homens.
Razões para seus crimes não há
E, mesmo assim, os da Lava Jato cometeram.
Sonharam e obtiveram riquezas e até
O Poder - às custas de mortes e
Sofrimentos de milhões de cidadãos.
De parte da Justiça nada cega,
A impunidade os privilegiou por algum tempo.
Ladrões e assassinos mesmo sem dar um tiro.
As suas famílias, amigos e eles próprios,
Vedaram olhos e ouvidos, calaram e compraram consciências
Acreditando que a impunidade seria eterna.
Jesus veio para nos salvar,
Ao povo redimir e revigorar a Fé e a Esperança.
Todos aqueles que pecaram por ações e omissões,
O arrependimento e o pedir o perdão é agora. É Natal.
♩♪♫♬ ☃☃☃☃☃ ☖☖☖☖☖ ☆☆☆☆☆ ♩♪♫♬
Depois de ler seu acróstico, só vejo uma alternativa para 2017: ser bem melhor do que foi 2016. Abraço!
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